terça-feira, 26 de maio de 2015

Análise: Mc Bin Laden e o Funk Teatral /Neoproibidão


Jefferson Cristian dos Santos de Lima, ex-Mc Jeeh JK, hoje Mc Bin Laden é um dos fenômenos mais proeminentes do movimento paulista de Funk atual. Com seu cabelo pintado de branco e preto, seu aparelho azul-berrante e sombrancelhas picadas, o Mc se destaca por liderar uma vertente do funk que não faz parte diretamente do fortíssimo movimento do funk ostentação que está dominando o mercado da música brasileira em níveis nacional e internacional. 
Bin Laden, no lugar, vanguardeia o movimento do funk "ousadia" juntamente ao seu bonde e artistas/colegas da KL Produtora (Mcs Brinquedo, Pikachu, 2K, entre MUITOS outros) e de outras gravadoras como a GR6 de Mc Livinho e Mc Pedrinho. Apesar de carregar este rótulo de "funk ousadia" consigo, a música de Bin Laden pessoalmente não apresenta em foco os temas tradicionais de erotismo humorístico do ousadia, e ela seria melhor definida como um revival que reinventa o Funk Carioca "Proibidão" de Tati Quebra Barraco e Mc Tigrão do fim dos anos 90 e começo dos anos 2000. Um "Neoproibidão", se me permitem. Bin Laden é um dos poucos funkeiros que ainda utiliza os samples de bateria que utilizavam os artistas deste comercialmente falecido movimento, ou seja, prioriza baterias eletrônicas 808 ou "tuns" e "pás" sampleados separadamente do que a agora popular linha do "tchu-tchá-tchá-tchu-tchu-tchá" utilizada com mais força no funk ostentação. A produção não é exatamente revolucionária ou impressionante, mas sinto muito mais personalidade no som dos instrumentais dele do que num simples tchu-tchá e um sample totalmente aleatório (modelo seguido pelos contemporâneos do funk ostentação). A produção é extremamente variada para os estandartes do funk, inclusive incorporando bases rítmicas diferentes em músicas como "Os Terroristas" e "12 Calibre". Tudo isso coberto pelo flow, obviamente inspirado pelo proibidão, de Bin Laden, com palavras longas e faladas de maneira didática, para serem cantadas por um coro de jovens enlouquecidos (um flow que Drake totalmente roubou do Brasil e utilizou em músicas como "6 God", de sua nova mixtape, só falando).
O que difere Mc Bin Laden do movimento que o inspirou, além do conteúdo lírico, que fala de assuntos modernos, é a ideologia por trás da música do jovem. Citando o artista em sua entrevista à Noisey, "eu falei (à produtora) que não queria cantar apologia, queria cantar proibidão, um negócio teatral. Que fosse o Bin Laden, mas com seus bonecos no palco, tendo uma história. O show mesmo é entretenimento." Seu nome artístico polêmico, o fato que suas tietes são chamadas de "Iraquianas", e seu show, "Baile do Afeganistão", tudo isso tem uma razão mais profunda que os ouvintes mais casuais desconhecem. Tudo é uma grande peça de teatro montada pela mente do Mc que, involuntariamente, encobre o verdadeiro significado da música de Bin Laden: retratar os momentos muito presentes na adolescência e juventude de um jovem da periferia hoje. Bin Laden tem origens muito simples, e ao perceber o quão utópicas eram as letras do funk ostentação, optou por fazer músicas com as quais a juventude periférica consiga se relacionar sem ter de enriquecer e gastar tudo o que tem em festas. Sinceramente, qual outro Mc dedicou músicas à lança, uma das drogas que mais se populariza nos grupos jovens desta década, antes, ou até mesmo além de Bin Laden? Se não há um contexto de quem o Mc é previamente, seus ouvintes determinam três coisas: Esse moleque fuma e lança o dia inteiro, paga de durão e ainda consegue se transformar numa piada ambulante no processo. Como a infame linha de ônibus de Campinas, temos aqui três mentiras: o jovem Jefferson não fuma nem lança, é um evangélico devoto frequentador de Igreja a três anos, que diz ter sido a melhor coisa que aconteceu em toda sua vida, e sabe muito bem que cada uma de suas sombrancelhas está divida em uns 6 pedaços e que ele está de meia preta na canela esquerda e branca na direita. O Mc é uma performance artística, que não teme ter uma imagem chamativa, pois sabe que é único no que faz e no que é.
"Laden" diz fazer música inspirado "na brisa dos outros", por mais que metade de suas composições, a parte mais divertida e brincalhona, sejam de alguma maneira relacionadas à maconha ou à lança. A outra metade trata mais do personagem "Bin Laden", e são claramente mais sombrias. Tem um flow mais acelerado, beirando ao rap e, em minha opinião, é nesta fileira que se encontram as músicas mais interessantes de Bin Laden. São as produções mais sombrias e positivamente minimalistas, com um liriscismo seminarrativo inspirado pelos Racionais Mcs (Jefferson diz ser fã do grupo) que prende a atenção dos ouvintes, ainda mais por serem cantadas pela voz de ronco de mitsubishi do Mc.
Músicas de destaque no público em sua discografia são O Passinho do Faraó, Bololo Haha  Lança de Coco, e a melhor parte destes hits é que um não tem absolutamente nada a ver com um outro. Todos tem produções carismáticas, divertidas e diferentes, e cada uma trata de um assunto, seja este um besteirol sobre uma droga recreativa (lança de coco), seja sobre os moleques zika de ak-47 na mão em cima das motos CB-1000 (Bololo haha), seja sobre pura zueira (passinho do faraó); Isso é uma característica constante no acervo de Bin Laden. Também vemos muita criatividade fonética, como no Ad-libitum utilizado em diversas músicas com "bololo" no nome ( Bololo Haha, Bololo, Bololo Chamado no Grau) (me refiro ao infame BOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLOLO que simula o ronco da moto quando acelerada, que tipo, todo mundo acima dos 11 e abaixo dos 20 anos conhece).
Bin Laden e seu bonde são um movimento divertido, artístico, essencial e, mais importante, zica pra caralho dentro do movimento funk. Tudo que precisávamos pro gênero progredir agora que estamos na metade da década de 2010.







RECOMENDAÇÕES (PESSOAIS) DO CATÁLOGO DO ARTISTA:

Bin Laden Não Morreu: Com um instrumental de dar medo, é um dos primeiros hits menores do
Mc. Ela é definitivamente minha favorita, e é a definição sonora de "Sinistrão".
Lança de Menta: A irmã menos conhecida de Tchuplin Tchuplin e Lança de Coco, é minha preferida das que tem como tema a lança. Tem uma ponte ("titio, chama a vovó...") que me lembra a de Quem Caguetou? de Black Alien e Speedfreaks, e um refrão ("toma lança de menta, fica em câmera lenta") que me remete ao estilo do Rae Sremmurd. É meio curta, mas é uma música criativa.
Bala de Ak: Deixo em segundo plano a letra da música, na qual Bin Laden diz ter aprendido o beabá pelos barulhos de uma Ak-47 ("Bê á Éle á, Ratatatatatatá"), mas o beat é fenomenal. Foi sampleado o barulho de uma arma recarregando e este foi repetido e ritmizado para fazer o ritmo do funk. É dificil explicar, apenas ouça-a e tire suas conclusões.
Os Terroristas (com Kadaff): A música, uma colaboração com o Angolano Kadaff, é uma espécie de afrobeat onde Bin Laden opta por fazer um rap em vez de cantar funk. Bin Laden não decepciona no Rap, e é uma música de nível simbólico alto, por ser uma das poucas colaborações musicais urbanas intra-ex-colônias portuguesas de que se tem notícia.

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